segunda-feira, 29 de junho de 2009


“Sou o que se chama de pessoa impulsiva. Como descrever? Acho que assim: vem-me uma idéia ou um sentimento e eu, em vez de refletir sobre o que me veio, ajo quase que imediatamente. O resultado tem sido meio a meio: às vezes acontece que agi sob uma intuição dessas que não falham, às vezes erro completamente, o que prova que não se tratava de intuição, mas de simples infantilidade.Trata-se de saber se devo prosseguir nos meus impulsos. E até que ponto posso controlá-los. [...] Deverei continuar a acertar e a errar, aceitando os resultados resignadamente? Ou devo lutar e tornar-me uma pessoa mais adulta? E também tenho medo de tornar-me adulta demais: eu perderia um dos prazeres do que é um jogo infantil, do que tantas vezes é uma alegria pura. Vou pensar no assunto. E certamente o resultado ainda virá sob a forma de um impulso. Não sou madura bastante ainda. Ou nunca serei.”


Clarice Lispector

quinta-feira, 25 de junho de 2009

E o dia nasceu feliz



Hoje ela estava espetacularmente feliz, vestia seu melhor vermelho. Flores amarelas por todos os lados... E flores amarelas sempre dizem muito por si mesmas; amor eterno. Amarelo e vermelho lhe caem bem. Hoje ela cantarolava várias músicas, boas e ruins, antigas e atuais. Hoje, enquanto ela corria dentro de seu mundo, esbarrou consigo mesma. Hei, ela é completa.
Hoje se descobriu completa. E para que tantas tristezas? Ela pertencia ao mundo, e o mundo pertencia a ela. Para que mais do que isso?
Hoje ela abriu as janelas e deixou o sol entrar, respirou fundo o cheiro de manhã úmida. Hoje acordou disposta a viver. Mais forte e segura do que costumava ser, hoje acordou disposta a deixar pra lá tanta coisa. Acordou pensando na Irlanda, na Itália e Inglaterra, um dia iria para lá – sempre dizia.
Hoje ela acordou pensando em não dormir. Tomou um banho tão quentinho que derreteu seu corpo todo, seu coração endurecido. Não queria mais saber de ninguém, estava satisfeita consigo mesma, pela primeira vez desde então. Hoje acordou respirando a vida nova que estava chegando, amanheceu o dia dando boas-vindas ao que tinha de melhor.
Hoje acordou.
Hoje é o presente... E presente ganho não se recusa.


Bruna Berri

terça-feira, 23 de junho de 2009

Ansiedade


Por quem diabos permaneço aqui? Por mim, claro, sempre por mim. Sempre tão egocêntrica, não é? Certas coisas nunca mudam.
Mas eu nunca sei o que fazer, sempre levada com o vento, carregada pelo destino. E você sempre, sempre, muito seguro de si... Com os pensamentos certos na hora certa. Sabe esperar. Mas eu não, sempre roendo minhas unhas, balançando meus pés e batucando com os dedos. Inquieta. Ansiosa. Eu nunca espero a hora. Sempre como até doer o estômago. Sempre quero mais do que posso ter.
E eu queria tanto, tanto. Dessa vez eu queria muito, de verdade. Mas eu não posso. Como o meu estômago então. Eu não sei ser assim tão paciente. Eu não sei esperar. Não me peça para esperar, por mais que sabemos que eu esperaria até não restar mais nada por aqui. Tente ser pontual dessa vez. Tente.
Mas até quando aguentarei permanecer debaixo dessa chuva seca? Até quando?


Bruna Berri

sábado, 13 de junho de 2009

Sussurros


Era mesmo assustador ouvir todas essas respirações ofegantes, ansiosas a minha volta. De longe um breve cochicho acompanhado de olhares julgadores. É estranho fazer isso, ouvir o silêncio.
Porque quando se ouve o silêncio ele não se contenta só em ser ouvido. É preciso tocá-lo, senti-lo... É preciso deixá-lo entrar para que ele permita sua entrada nele.
E o silêncio é escuro, é o negro. Ele absorve tudo. E como eu me sentia sugada constantemente naquele lugar!
E como eu queria estar sozinha. Sempre fui arrogante demais para longas convivências, amarga demais para fazer alguém feliz. Sempre fui calada demais ao falar a verdade. E a falta de compreensão alheia perante meu silêncio me torna vazia. E como eu odiava ser vazia!
Ele jamais me entenderia... Ele jamais entenderia essa minha ausência de voz, mas eu sei que ele sabe. Fingimos que não. Finjo ter muito a falar, enquanto o que eu queria mesmo que fosse dito está entalado há tempos.


Bruna Berri


"Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa. Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso." Clarice Lispector

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Dane-se o mundo


Dessa vez eu estava tão cansada, tão exausta que chegava a faltar fôlego. E jurei para mim mesma que não ficaria desesperada novamente, que não perderia o chão, eu não me machucaria. Está tarde demais para isso, para esse drama todo.
Eu quero mesmo é que se dane. Dane-se seu sorriso. Danem-se suas músicas preferidas. Danem-se seus livros. Danem-se suas teorias. Dane-se sua maneira de ver o mundo.
Danem-se nossos planos. Dane-se nosso passado. Danem-se as viagens. Dane-se minha preocupação.
Dane-se meu sentimento. Dane-se a inexistência do seu.
Prestou atenção? Dane-se você.


Bruna Berri

terça-feira, 9 de junho de 2009


Eu ouvi promessas e isso não me atrai.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Procura-se um destino.


Afinal, onde é que ele estava? Acordou pensando nisso... Não estava ao seu lado, não estava em lugar algum. Existia? Existia, existia, tinha certeza disso. Em que lugar? Era tudo o que desejava saber.
Então abria a geladeira... Mas o que estava fazendo? Era óbvio que ele não estava lá. E não estava debaixo de sua cama, ou sentado na ponta da mesa, nem deitado no sofá. Isso já se sabia. Mas às vezes, quando acorda gélida, procurar tanto lhe tirava o fôlego. Porque não fazer nem idéia do que se procura é levemente sufocante.
Lhe disseram uma vez que saberia a hora. A hora. Quisera saber também onde essa encontraria. Mas não sabia - claro que não sabia.
Portanto espalhava pelas ruas sua crença por destino. Os pingos de chuva sempre trazem de volta sua confiança, sempre fazem com que não desista de sua procura.
Quem procura acha.
E não fazia nem idéia do quão próximo estava.


Bruna Berri